Othello, the Moor of Venice


Olá pessoas, mais uma leitura finalizada. Otelo, uma peça de William Shakespeare, leitura para a aula de Literatura Inglesa I, para reflexão. O seguinte diário de leitura também foi elaborado para o diário que a professora dessa disciplina pediu como forma de avaliação.




           Quando uma simples desconfiança vira uma obsessão descontrolável, os psicológicos chamam de ciúme patológico, ou simplesmente, síndrome de Otelo. O mouro de Veneza é lembrado por sua desconfiança que chegou ao ponto de ele cometer o crime do assassinato.
            Levado a desconfiar de sua esposa Desdêmona, Otelo, após achar que também estava sendo enganado por seu primeiro-tenente Cássio, o suposto amante de sua esposa. Tudo arquitetado por Iago, que além de ter uma inveja de Cássio, tem raiva de Otelo e preconceito por servir uma pessoa negra.
            Otelo é um homem que lutou em inúmeras batalhas, que o fizeram ganhar notoriedade até chegar ao posto de liderança como general da República de Veneza. Foi muito reconhecido por seus feitos, mas se sente inferior em relação a Cássio por alguns fatores.
            O primeiro deles é que Otelo sabe guerrear, tem maior experiência militar que Cássio, vem de uma origem humilde, mas segundo Otelo, ele se sente frustrado por não saber lidar com a oratória da mesma maneira que Cássio, que não tendo uma vasta experiência militar, vem de uma família mais abastada, então recebeu uma boa educação. Ele expressa essa insatisfação no Ato I, cena III.

Othello – Rude am I in my speech,
And little blest with the soft phrases of Peace;
For since these arms of mine had seven years’ pith,
Till now some mine moons wasted, they have used
Their dearest action in the tented field;
And little of this great world can I speak,
More than pertains to feats of broil and battler; [...]

Um segundo fator que, é a juventude de Cássio, contra a diferença de idade entre Desdêmona e Otelo. O terceiro ponto, é a cor de sua pele, a qual Otelo que se lamenta, mas que Brabâncio (pai de Desdêmona) e Iago ficam sempre lembrando em suas falas. Primeiro, o pai de moça acusa Otelo que para conquistar sua filha usou de meios mágicos e que Desdêmona estaria enfeitiçada por algum encantamento. Iago, sempre se refere a Otelo com alguma ofensa, quando não está perto do general.
Brabâncio é uma peça importante do plano de Iago, mesmo que indiretamente. Foi ele que primeiro acusou o mouro aos senadores de Veneza o acusando de feitiçaria e pela fuga de sua filha, e ao final, com toda a história esclarecida pela própria Desdêmona, ele o chama ao canto e o alerta para ter cuidado, pois do mesmo jeito que ela enganou o pai, ela poderia enganar Otelo.

Brabantio – Look to her, Moor, if thou hast eye those;
She has deceived her father, and maythee.
(Act I, scene III)
           
            O ciúme despertado por Iago, e não incitado, já existia em Otelo, causado, segundo psicólogos, por baixa autoestima. As pessoas que sofrem com essa opinião pessoal, não se sentem seguras consigo mesmas e acabam refletindo em suas relações sociais, mas algumas vezes, vira um ciúme abusivo, obsessivo e perigoso, a partir daí, surge o referido ciúme patológico.
            Não só em Otelo, mas também em encontramos um exemplo na literatura realista brasileira: Dom Casmurro. Bentinho, que em criança era prezado por sua mãe, que vivia em um luto por seu irmão natimorto, casa-se com Capitu e quando seu filho, que adorava imitar as pessoas em seu redor, chega em uma certa idade e começa a ficar parecido com seu amigo Edgar, segundo sua desconfiança, ele começa a pensar que Capitu foi infiel a ele. Apesar de suas suspeitas, Bentinho não comete nenhum crime como Otelo cometeu, por mais que o pensamento não o deixava.
            Até o momento em que Iago insinua, que há algo entre Desdêmona e Cássio, o mouro não tinha nenhuma insegurança, mas a partir deste momento, qualquer atitude ou fala de um dos supostos amantes era motivo para o ciúme crescer cada vez mais em Otelo.
            Iago também é levado a ter as atitudes que tomou por inveja, também um sentimento psicológico, sentimento que seu general do mesmo modo demonstra, mas demonstra com Cássio. Iago arquiteta um plano que vai dando certo até o momento que sua esposa conta a verdade a Otelo.
            Esse plano começa a funcionar quando Iago sugere que há um caso amoroso entre Cássio e Desdêmona. Em um certo momento, ele leva Otelo a escutar uma conversa com dele, Iago, com Cássio, fazendo que a conversa se baseia na esposa do mouro e não em Bianca, de quem Cássio realmente estava conversando. Para fermentar mais a cisma do general, Iago sugere pedir para Desdêmona o seu lenço, que foi o primeiro mimo que ela ganhou de Otelo, já o sabendo que ela não estaria com o objeto, plantando-o no quarto de Cássio, como se ele tivesse recibo como presente de Desdêmona.
            Quando a moça não consegue apresentar o lenço e Otelo o descobre dentro do quarto de seu primeiro-tenente, plantado por Iago, que por descuido proposicional deixa uma adaga ao alcance das mãos de Otelo, que dominado pela raiva, ciúmes, e com sua honra ferida, segue para o quarto de sua amada e a mata. Até alguns anos atrás o marido tinha o direito de matar sua esposa, caso ela o traísse, pois na época, as mulheres eram educadas a serem fiéis a seus maridos, por mais que eles não o fossem. 
            O ciúme e a infidelidade sempre estiveram juntos, algumas vezes como inimigas e outras como amigas, por exemplo na idade média que o marido, tomado por sua honra e sua raiva fazia as mais perversas punições para suas esposas adulteras, como entrega-la a um grupo de leprosos para estupra-la ou preparar e comer o coração de seu amante (ACKERMAN, 1997, apud ALMEIDA, 2007 p. 123).
            Almeida (2007) explica que na Alemanha no século XIX, Freud concebeu o ciúme como um estado emocional e “tinha uma conotação negativa e estava atrelado à vaidade quando dizia que o que tornava a dor do ciúme tão aguda era a vaidade que não contribuía para nos ajudar a suporta-la” (p. 124).
O ciúme que Otelo desenvolve do suposto caso é tão irracional que ele não vai atrás de conversar e juntar os fatos que realmente aconteceram, mas apenas se baseia no que Iago induz Cássio a falar, no lenço que Iago planta no quarto de Cássio e na armação de ver os dois conversando sozinhos.
O sentimento do ciúme nos deixa irracionais, acreditando que tudo está se encaixando perfeitamente em nossa paranoia, e nos tirando da objetividade pouco a pouco, impossibilitando ser fiel a realidade.
A possessão e o ciúme têm seus pontos de ruptura e de interseção. Quando se pensa que você possui o parceiro como extensão de nós que ao mínimo motivo de achar que se pode perder essa pessoa, se torna um ciúme possessivo, doentio.

[...] Querer ter a posse exclusiva de uma pessoa, como ela fosse parte de si, denota insegurança, medo da rejeição, medo da perda, falta de confiança em si mesmo, o que acaba gerando também o ciúme. 
                                                    (ALMEIDA, 2007, p. 147)

            Ainda, segundo Almeida (2007), o ciúme mórbido ou patológico, denominado síndrome de Otelo, inclui várias emoções e pensamentos irracionais e perturbadores, e ao chegar em um ponto elevado, destrói o objeto de seu sentimento. Então, ao descobrir todo o plano arquitetado por Iago, Otelo tomado de uma raiva sobre si e de remorso, utiliza a mesma adaga para atingir a si mesmo e morrer aos braços de sua amada.
            Iago é um ótimo manipulador, que na peça, chegou ao ponto de ser chamado de ser honesto. O alferes tem a intenção de fazer com que as pessoas enxerguem o Otelo como ele o vê: um selvagem, um ser de raça inferior, sem ser digno de ter a patente de general. Quase o que consegue faze-lo. Shakespeare trata o assunto com maestria, traz a sociedade da época, uma sociedade racista, preconceituosa e que se sentia superior ao próximo.
            Desdêmona também não foge de uma análise psicológica. Inocente das acusações levantadas por Otelo, ela tem uma ingenuidade que chega a ser muito estereotipada, da mulher submissa e que não pode pensar mal de qualquer ser que viva na terra, deste modo, ela não vê nem maldade em Iago. A única pessoa que vê, mas junto com Desdêmona é ingênua e não pensa que pode ser seu marido a tramar todo o plano é Emília, que jura matar-se se ficar sabendo que conhece a pessoa que está tramando contra sua ama.
            É Desdêmona também que é levada à frente de todos os senadores de Veneza e de seu pai atestar a veracidade de seu amor por Otelo e não feito de feitiçaria como seu pai acusou seu marido.
            Quando Iago convence Cássio a pedir ajuda a Desdêmona, que por coincidência é sua prima, não desconfia que alguém está tramando para acabar com o casamento  da moça e que, Otelo, já que levado a acreditar que eles estão tendo um caso amoroso, ao pedido de de sua esposa que ele restitua o cargo em que seu suposto amante foi retirado, coloca-se na posição de acusada e de confissão de seus supostos crimes.
            A descrição da personagem Desdêmona, nos traz para um caminho mais subjetivo, pois sua característica mais marcante é cor dos seus olhos serem do mesmo verde que os olhos de Capitu. A cor verde representa o crescimento como a relva, a grama, mas também é a cor do mofo e da inveja. Já ouvimos alguma vez em nossas vidas alguém dizer que uma pessoa está “verde de inveja”. Desse modo, é nos levado a pensar na possibilidade de Desdêmona ser o símbolo da inveja. Otelo por toda sua baixa autoestima, tem inveja de Cássio, mas ele de certo modo coloca Desdêmona como objeto de inveja dos outros para ele. É o caso de Rodrigo, personagem que é apaixonado por Desdêmona e que também é manipulado por Iago o ajudar com o seu plano de acabar com o casamento entre a moça e o mouro.
            A peça Shakespeariana temos alusões a um “monstro”, e uma destas alusões é feita pelo próprio Iago, na cena III, do Ato III: “Acautelai-vos senhor; do ciúme; é um monstro de olhos verdes”. Podemos interpretar de duas maneiras a fala de Iago. A primeira refere-se ao sentimento do ciúme, da inveja, que ele tanto tem e que quer despertar em Otelo; a segunda, fala sobre o disfarce de falar do sentimento, ele chama Desdêmona de monstro que por ter a cor dos olhos verdes, despertou o animal selvagem que existe, segundo seus pensamentos, dentro do general. A intepretação de sua fala pode ser realizada pessoalmente, sendo que cada leitor é único.
            É uma peça recheada de teor psicológico, onde a manipulação domina a psicose do ciúme, da inveja, do sentimento de inferioridade e faz com ela ações imprevisíveis. Uma junção explosiva que dessas síndromes. Nos apresenta também o tema recorrente nas tragédias de Shakespeare, a aparência versus a realidade.
            Iago era pessoa em que todos os outros personagens confiaram e que diziam ser honesto, mas na realidade era um manipulador e que se sentia superior a Otelo, que por sua vez, se sentia inferior, maltratado pela juventude, beleza, riqueza e pela forma de falar de Cássio. Iago, sente inveja de Cássio, mas porque Cássio foi promovido a primeiro-tenente ao invés dele, sendo que ele, Iago, tinha mais experiência militar.
            Cada personagem traz uma densa camada de fatores e constroem suas personalidades, tendo uma grande variedade de fenômenos emocionais, sendo uma rica fonte para estudos psicológicos.



REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Thiago de. O ciúme e suas consequências para os relacionamentos amorosos. 20ª ed. Curitiba: Editora Certa, 2007, 243 p. Disponível para download em: www.thiagodealmeida.com.br/site/publicacoes/ acesso em: 14/09/2018.
ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Coleção TRAVESSIAS. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora Moderna, 2004, 160 p.
CENTEVILLE, Valéria. Ciúme patológico masculino: reflexões sob a ótica junguiana. 149 f. Tese (Mestrado em psicologia clínica) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.
CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain et al. Dicionário de símbolos. 23ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2009. 996 p.


Ficha técnica:
Nome: Othello, the Moor of Venice
Autor(a): William Shakespeare
Editora: Yale University Press
Edição: -
Ano: 2005
N° de páginas: 268
Foto: Paul Robeson as Othello, photographed by Carl Van Vechten (1944)

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